A ideia de um programa de testes foi lançada na
primeira manifestação de Teich após ser apresentado pelo presidente Jair
Bolsonaro, no Palácio do Planalto, como o substituto do ex-ministro, Luiz
Henrique Mandetta.
Ontem, ao tomar posse, Teich afirmou
que a atuação do Ministério da Saúde será focada nas pessoas e que os mais
pobres sofrerão com maior intensidade os efeitos da pandemia do coronavírus.
2 - Especialistas concordam que
testagem em massa, como vem sendo realizada na Coreia do Sul, por exemplo,
seria ideal, mas ressaltam as limitações para que essa medida seja colocada em
prática.
Entre os desafios, estão obter kits
de qualidade e traçar uma estratégia para realizar os exames.
Para eles, o distanciamento social,
medida que vem sendo criticada por Bolsonaro e que colocou o presidente em rota
de colisão com Mandetta, é a única disponível neste momento para conter um
crescimento exponencial do número de casos e o colapso do sistema de
saúde.
O próprio Teich disse que, por
enquanto, não haverá nenhuma mudança brusca.
Cinco perspectivas
"Exames foram aprovados a toque de caixa" Sergio Cimerman,
infectologista e colunista do jornal O Estado de S. Paulo
O médico infectologista e colunista do Estado Sergio Cimerman destaca
que a falta de experiência no Sistema Único de Saúde (SUS) do novo ministro
Nelson Teich, vindo da iniciativa privada, pode ser contornada com a formação
de boa equipe técnica.
"Ele tem de tomar atitudes técnicas, médicas, não políticas.
Manter o isolamento horizontal, fazendo uma reavaliação a cada 15 ou 30 dias, para não haver um colapso no sistema hospitalar", afirma.
A qualidade dos exames, diz, é um desafio para a testagem em massa.
"O problema desses testes, no mundo todo, é que foram aprovados a
toque de caixa, emergencialmente, não têm validação, nenhum teste tem
validação.
A sensibilidade é baixa. Um teste adequado deve ter sensibilidade acima de 90% e esses não chegam a 90%.
" Segundo ele, porém, a testagem é uma boa solução, já que há subnotificação de casos no País. "Com a testagem, vamos saber o perfil epidemiológico do Brasil e o número real", diz.
"Mas é impossível testar 212 milhões de pessoas, é um país continental,
tem município onde nem se consegue chegar.
A ideia é começar por profissionais de saúde.
4" - Investir em pesquisa é o que pode nos
salvar"
Luiz Davidovich, presidente da Academia Brasileira de Ciências
Para o físico Luiz Davidovich, presidente da
Academia Brasileira de Ciências, o novo ministro da Saúde, Nelson Teich, terá
necessariamente de seguir as políticas de isolamento que Luiz Henrique Mandetta
vinha adotando, sob o risco de ter de arcar com a responsabilidade de ver um
número enorme de mortos no Brasil.
"É o que está sendo feito em outros países.
É só olhar para o que aconteceu com países que tinham uma visão diferente no começo e depois deram uma guinada, que são Inglaterra e Estados Unidos."
Para ele, o cenário não deixa margem para tentativas que não se baseiem na ciência e até a definição sobre reduzir o isolamento virá da ciência. Para tomar essa providência, diz, será preciso "muito mais testagem".
Ele lembra que vários laboratórios de universidades
brasileiras estão testando novas formas de diagnóstico e defende que mais
dinheiro seja aplicado.
"O investimento em pesquisa é o que pode nos salvar.
Tanto as vidas quanto a economia."...
"É preciso saber onde usar diagnóstico"
Fernando Reinach, biólogo e colunista do jornal
O Estado de S. Paulo
O biólogo e colunista do Estado Fernando Reinach
aponta que o problema da testagem em massa é ter um planejamento.
"O que ele vai fazer?
Vai isolar as pessoas?
Só testar não adianta, e ele não falou nada sobre o plano", diz.
Outra questão importante na elaboração da política do Ministério da Saúde, de acordo com Reinach, é levar em conta a escassez de testes para diagnosticar o novo coronavírus.
"Quando temos poucos testes, é preciso saber muito bem onde eles serão usados, onde obteremos mais resultados.
E ele não mostrou os planos", diz.
"Sobre a manutenção do isolamento, a gente só
vai saber mesmo pelas atitudes, mais do que pelas declarações"
afirma.
"Agora ele vai ter de mostrar a que veio."...
"Isolamento social ampliado é o
correto"
Roberto Medronho, epidemiologista da UFRJ
Embora o poder público já se mobilize para ampliar a capacidade de testagem no Brasil, o plano de fazer exames em massa esbarra na dificuldade de comprar kits e insumos, sobretudo diante da disputa no mercado internacional.
"De toda forma, não temos condições, no momento, e isso não vai acontecer da noite para o dia, de testar 100% da população", diz Roberto Medronho, epidemiologista da Universidade Federal do Rio (UFRJ).
"Já perdemos dias valiosíssimos, num momento em que perder horas significa perder vidas, com todo o desgaste, todas as ações para queimar e isolar o ministro da Saúde."
A testagem é a chave, reforça, para fazer controle
da epidemia e saber quando será melhor sair do isolamento.
Medronho diz estar preocupado com o
"alinhamento" que o novo ministro diz ter com o presidente Jair
Bolsonaro.
"Espero que esse alinhamento seja no sentido
de o presidente ter feito autocrítica e se convencido de que o isolamento social
ampliado é a medida correta.
Se for o inverso, seria trágico", alerta.
"Estamos na curva ascendente dos casos e os
serviços de saúde nas grandes capitais já entram em colapso...
"Desafio será a articulação entre as
pastas"
Chrystina Barros, ex-colega de Teich
pesquisadora
do Centro de Estudos em Gestão e Serviços de Saúde da Universidade Federal do
Rio (UFRJ), conhece o novo ministro de perto - Teich foi seu chefe entre 2012 e
2018 em uma rede de clínicas oncológicas.
Segundo ela, o novo titular da Saúde é
"íntegro, competente e técnico" e um oncologista de "formação
sólida", também na área de negócios.
"Ele tem um trabalho
importante em gestão de saúde.
E gestão, independentemente de ser pública ou
privada, tem de ser pautada por questões técnicas", acrescenta.
"O grande desafio que ele vai ter será organizar uma estrutura de informação, de articulação entre os vários ministérios", diz.
"A cada
dia recebemos novos dados, validamos modelos anteriores, projeções, sabemos da
ocupação dos hospitais.
Se os leitos estão ocupados, tem de manter as
restrições do isolamento."
Para Chrystina, há uma lacuna sempre que ocorre uma
transição, agravada ainda pelas dimensões continentais do Brasil, que tem
cidades com população equivalente à de países da Europa.
"O ideal era que não tivéssemos uma mudança
num momento desses, mas aconteceu", afirma. .
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